Por que, pois,declaramos que o Espiritismo não é uma religião?
1º PARTE
(1) A primeira parte desse discurso foi tomada de uma publicação anterior sobre a Comunhão de pensamentos, mas que era necessário lembrar, por causa da sua ligação com a idéia principal.
REVISTA ESPIRITA
11o ANO NO. 12 DEZEMBRO 1868
SESSÃO ANUAL COMEMORATIVA DOS MORTOS
(Sociedade de Paris, 1° de novembro de 1868)
DISCURSO DE ABERTURA PELO SR. ALLAN KARDEC (1)
"Em qualquer lugar que se encontrem duas ou três pessoas reunidas em meu nome, eu me encontro ali no meio delas." (S. Mateus, cap. XVIII, v. 20.)
Caros irmãos e irmãs espíritas Estão reunidos, neste dia consagrado pelo uso à comemoração dos mortos, para dar àqueles de nossos irmãos que deixaram a Terra, um testemunho particular de simpatia; para continuar as relações de afeto e de fraternidade que existiam entre eles e nós quando vivos, e para chamar sobre eles as bondades do Todo-Poderoso. Mas porque nos reunir? Não podemos fazer, cada um em particular, o que nos propomos fazer em comum?
Que utilidade pode nisto terem se reunir assim num dia determinado?
Jesus no-lo indica pelas palavras que reportamos acima. Esta utilidade está no
resultado produzido pela comunhão de pensamentos que se estabelece entre pessoas reunidas com um mesmo objetivo.
Mas compreende-se bem toda a importância desta palavra: Comunhão de
pensamentos? Seguramente, até este dia, poucas pessoas dela se fizeram uma idéia completa. O Espiritismo, que tantas coisas nos explica pelas leis que nos revela, vem ainda nos explicar a causa, os efeitos e o poder desta situação do Espírito.
Comunhão de pensamento quer dizer pensamento comum, unidade de intenção, de vontade, de desejo, de aspiração. Ninguém pode desconhecer que o pensamento seja uma força; mas é uma força puramente moral e abstrata? Não; de outro modo não se explicariam certos efeitos do pensamento, e ainda menos da comunhão de pensamento.
Para compreendê-lo, é preciso conheceras propriedades e a ação dos elementos que constituem a nossa essência espiritual, e é o Espiritismo que no-lo ensina.
O pensamento é o atributo característico do ser espiritual; é ele que distingue o
espírito da matéria: sem o pensamento, o espírito não seria espírito. A vontade não é um atributo especial do espírito, é o pensamento chegado a um certo grau de energia; é o pensamento tornado força motora.
É pelo pensamento que o espírito imprime aos membros e ao corpo os movimentos num sentido determinado. Mas se ele tem o poder de agir sobre os órgãos materiais, quanto esta força deve ser maior sobre os elementos fluídicos que nos cercam! O pensamento age sobre os fluidos ambientes, como o som age sobre o ar; esses fluidos nos trazem o pensamento como, o ar nos traz o som.
Podese, pois, dizer com toda a verdade que há nesses fluidos ondas e raios de pensamentos que se cruzam sem se confundirem, como há no ar ondas e raios sonoros.
Uma assembléia é um foco de onde irradiam pensamentos diversos; é como uma
orquestra, um coro de pensamentos onde cada um produz uma nota. Disto resulta uma multidão de correntes e de eflúvios fluídicos dos quais cada um recebe a impressão pelo sentido espiritual, como num coro de música, cada um recebe a impressão dos sons pelo sentido do ouvido.
Mas, do mesmo modo que há raios sonoros harmônicos ou discordantes, há também pensamentos harmônicos ou discordantes. Se o conjunto é harmônico, a impressão é agradável; se é discordante, a impressão é penosa. Ora, por isto, não há necessidade de que o pensamento seja formulado em palavras; a irradiação fluídica não existe menos, quer ela seja expressada ou não; se todos são benevolentes, todos os assistentes nele experimentam um verdadeiro bem-estar, e se sentem comodamente; mas se é misturada com alguns pensamentos maus, eles produzem um efeito de uma corrente de ar gelado no meio tépido.
Tal é a causa do sentimento de satisfação que se sente numa reunião simpática; ali reina como uma atmosfera moral saudável, onde se respira comodamente; dali se sai reconfortado, porque se está impregnado de eflúvios salutares.
Assim se explicam também a ansiedade, o mal-estar indefinível que se sente num meio antipático, onde os pensamentos malévolos provocam, por assim dizer, correntes fluídicas doentias.
A comunhão de pensamentos produz, pois, uma espécie de efeito físico que reage
sobre o moral; é o que só o Espiritismo poderia fazer compreender. O homem o sente instintivamente, uma vez que procura as reuniões onde ele sabe encontrar essa comunhão; nessas reuniões homogêneas e simpáticas, ele haure novas forças morais; poder-se-ia dizer que ali recupera as perdas fluídicas que ele faz cada dia pela irradiação do pensamento, como recupera pelos alimentos as perdas do corpo material.
A esses efeitos da comunhão de pensamentos junta-se um outro que lhe é
conseqüência natural, e que importa não perder de vista: é a força que adquire o
pensamento ou a vontade, pelo conjunto dos pensamentos ou vontades reunidas. Sendo a vontade uma força ativa, esta força é multiplicada pelo número das vontades idênticas, como a força muscular é multiplicada pelo número dos braços.
Estabelecido este ponto, concebe-se que nas relações que se estabelecem entre os homens e os Espíritos, haja, numa reunião onde reina uma perfeita comunhão de pensamentos, uma força atrativa ou repulsiva que um indivíduo isolado nem sempre possui.
Se, até o presente, as reuniões muito numerosas são menos favoráveis, é pela
dificuldade de obter uma homogeneidade perfeita de pensamentos, o que se prende à imperfeição da natureza humana sobre a Terra. Quanto mais as reuniões são numerosas, mais nela se misturam elementos heterogêneos que paralisam a ação dos bons elementos, e que são como os grãos de areia numa engrenagem.
Não ocorre o mesmo nos mundos mais avançados, e esse estado de coisas mudará sobre a Terra, à medida que os homens se tornarem melhores.
Para os Espíritas, a comunhão de pensamentos tem um resultado mais especial
ainda. Vimos o efeito dessa comunhão de homem a homem; o Espiritismo nos prova que ela não é menor dos homens para os Espíritos, e reciprocamente. Com efeito, se o pensamento coletivo adquire força pelo número, um conjunto de pensamentos idênticos, tendo o bem por objetivo, terá mais força para neutralizar a ação dos maus Espíritos; também vemos que a tática destes últimos é de levar à divisão e ao isolamento. Sozinho, um homem pode sucumbir, ao passo que se sua vontade está corroborada por outras vontades, ele poderá resistir, segundo o axioma:
A união faz a força, axioma verdadeiro no moral como no físico.
De um outro lado, se a ação dos Espíritos malévolos pode ser paralisada por um
pensamento comum, é evidente que a dos bons Espíritos será secundada; sua influência salutar não encontrará obstáculos; seus eflúvios fluídicos, não sendo detidos por correntes contrárias, se derramarão sobre todos os assistentes, precisamente porque todos os terão atraído pelo pensamento, não cada um em seu proveito pessoal, mas em proveito de todos, segundo a lei de caridade.
Descerão sobre eles em língua de fogo, para nos servir de uma admirável imagem do Evangelho.
Assim, pela comunhão de pensamentos, os homens se assistem entre si, e, ao
mesmo tempo, assistem os Espíritos e são por eles assistidos. As relações do mundo visível e do mundo invisível não são mais individuais, são coletivas, e, por isto mesmo mais poderosas para o proveito das massas, como para o dos indivíduos; em uma palavra, ela estabelece a solidariedade, que é a base da fraternidade.
Cada um não trabalha só para si, mas para todos, e em trabalhando todos cada um nisso encontra sua conta; é o que o egoísmo não compreende.
Graças ao Espiritismo, pois, compreendemos o poder e os efeitos do pensamento
coletivo; explicamo-nos melhor o sentimento de bem-estar que se experimenta num meio homogêneo e simpático; mas sabemos igualmente que ocorre o mesmo com os Espíritos, porque eles também recebem os eflúvios de todos os pensamentos benevolentes que se elevam para eles, como uma emanação de perfume. Aqueles que são felizes sentem uma maior alegria desse concerto harmônico; aqueles que sofrem dele sentem um maior alívio.
Todas as reuniões religiosas, seja qualquer culto a que pertençam, são fundadas
sobre a comunhão de pensamentos; é aí, com efeito, que ela deve e pode exercer toda a sua força, porque o objetivo deve ser o desligamento do pensamento das amarras da matéria. Infelizmente, a maioria se afastou deste princípio, à medida que fizeram da religião uma questão de forma.
Disto resultou que, cada um fazendo consistir seu dever no cumprimento da forma, se acredita quite com Deus e com os homens, quando praticou uma fórmula. Disto resulta ainda que cada um vai aos lugares de reuniões religiosas com um pensamento pessoal, por sua própria conta, e, o mais freqüentemente, sem nenhum sentimento de confraternização em relação aos outros assistentes: ele está isolado no meio da multidão, e não pensa no céu senão para si mesmo.
Não era certamente assim que o entendia Jesus quando disse: "Quando estiverdes vários reunidos em meu nome, eu estarei em vosso meio." Reunidos em meu nome, quer dizer, com um pensamento comum; mas não se pode estar reunidos em nome de Jesus sem assimilar os seus princípios, a sua doutrina; ora, qual é o princípio fundamental da doutrina de Jesus?
A caridade em pensamentos, em palavras e em ações.
Os egoístas e os orgulhosos mentem quando se dizem reunidos em nome de Jesus, porque Jesus os desaprova por seus discípulos.
Tocados por esses abusos e desvios, há pessoas que negam a utilidade das
assembléias religiosas, e, por conseguinte, dos edifícios consagrados a essas
assembléias. Em seu radicalismo, eles pensam que melhor seria construir hospícios do que templos, tendo em vista que o templo de Deus está por toda a parte, que ele pode ser adorado por toda a parte, que cada um pode pedir em sua casa e a toda hora, ao passo que os pobres, os doentes e os enfermos têm necessidade de lugares de refúgio.
Mas do fato de que são cometidos abusos, de que se afastou do caminho reto,
segue-se que o caminho reto não existe, e que de tudo o que se abusa seja mau?
Falar assim é desconhecer a fonte e os benefícios da comunhão de pensamento que deve ser a essência das assembléias religiosas; é ignorar as causas que a provocam.
Que materialistas professem semelhantes idéias, se o concebe; porque, por eles, em todas as coisas fazem abstração da vida espiritual; mas da parte de espiritualistas, e melhor ainda de Espíritas, isto seria um contra-senso.
O isolamento religioso, como o isolamento social,conduz ao egoísmo. Que alguns homens sejam bastante fortes por si mesmos, bastante e largamente dotados pelo coração, para que sua fé e sua caridade não tenham necessidade de ser aquecidas em um foco comum, é possível; mas não ocorre assim com as massas, a quem é preciso um estimulante, sem o qual elas se poderiam deixar ganhar pela indiferença. Além disto, qual é o homem que possa se dizer bastante esclarecido para não ter nada a aprender no que toca aos seus interesses futuros?
bastante perfeita para abster-se de conselhos na vida presente? É sempre capaz de se instruir por si mesmo? Não; ele precisa da maioria dos ensinamentos diretos de religião e de moral, como em matéria de ciência. Sem contradita, esse ensinamento pode ser dado por toda a parte, sob a abóbada do céu como sob a de um templo; mas por que os homens não teriam lugares especiais para negócios do céu, como os têm para os negócios da Terra?
Espiritismo não é uma religião,Espiritismo não é uma religião
Espiritismo não é uma religião,Espiritismo não é uma religião
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